"Sou artista, professora, produtora e trabalho desde 1997 nas áreas da dança, educação e produção cultural. Recebi formação em diferentes estilos de dança (desde 1994) e, pelo meu interesse em línguas e ensino, licenciei-me em “Ensino de Português e Inglês”, na Universidade de Évora em 2003. O interesse pelo estudo do corpo a partir de diferentes perspetivas levou-me ainda ao estudo de terapias alternativas, sendo formada em Massoterapia pelo Instituto de Medicina Tradicional de Lisboa 2013. A minha vida não tem um caminho linear, uma sequência única, nem a nível profissional nem pessoal, tendo mudado de país e muitas vezes de cidade. Profissionalmente trabalhei como professora, bailarina, massoterapeuta, produtora, road manager e tour manager de diferentes projetos musicais. Apesar desta enorme variedade de trabalho, há um foco comum a todos os projetos nos quais me envolvi e continuo a envolver – arte/educação/comunidade. Desde 2021 sou formadora do ACM Alto Comissariado para as Migrações em Educação Intercultural, um trabalho que parece juntar as diferentes peças da minha vida, sem que deixe de continuar a aceitar novos desafios. Foi com enorme alegria e sentido de compromisso que agradeci o convite à Madalena e aceitei juntar-me ao BOWING em 2021. Comecei por conhecer as crianças e jovens. Viagens de carro – ir buscá-las e levá-las a casa com muitas conversas pelo meio. Inglês, Português, Espanhol, Hindi, Nepali – sempre perguntas e respostas que variavam de língua, de som, de ritmo – o movimento das línguas pelo movimento da estrada. Estas crianças tinham uma relação forte com toda a equipa Bowing e queriam dançar, libertar-se, estar juntos nos locais que conheciam mas que naquele momento ganhavam outro significado. Nos ensaios abraçámo-nos, rimos juntos, aprendemos sequências de dança, cantámos, usámos a cópia para criar novas ideias e houve espaço para que cada um encontrasse o seu lugar. O caminho foi difícil, mas chegámos a um outro ponto das nossas vidas no fim deste percurso. Estes jovens trazem consigo muitas emoções. Muitas e constantes, sempre radicalmente opostas – amo estar aqui, odeio estar aqui, não sei o que sinto por estar aqui... Tenho realmente amigos? Quem são e de onde são? O que é ser daqui ou ser do Nepal? Como construo a minha identidade? Será que vamos mesmo ficar aqui e devo empenhar-me na integração ou será que não valerá a pena porque estamos apenas de passagem? O que significam os olhares que recebo dos outros? Que olhares é que lanço aos outros? Depois há os adultos, os que estão sempre a trabalhar. Por vezes tão cansados que não têm corpo que lhes permita pensar tanto como os jovens. Uns estão sós, outros com as famílias. As dificuldades são enormes – manter uma cultura, adaptar-se a outra com pouco tempo para o fazer... As responsabilidades da casa, do emprego, do dinheiro e da família comem o espaço e o tempo dos adultos. Sorriem com a ideia de entrar num salão de uma Junta de Freguesia para ir dançar, falar, cantar, estar com outros que pertencem a diferentes comunidades e culturas. Acho que ao início não acreditavam que aquela visão era real. Se calhar aquela noite de dança tinha sido apenas um sonho. Mas de repente há continuidade. Chegam mais e todos os fins-de-semana juntam-se para partilhar aquela experiência. São as experiências positivas que nos transformam a mente em relação aos outros e a nós próprios. São experiências positivas que nos fazem continuar a acreditar na existência de outros caminhos e ideias. São experiências positivas que nos unem e nos fazem dialogar. Lembro-me de muitas conversas, mas também de movimentos, expressões, olhares, sorrisos que não precisaram de palavras. As minhas memórias fortes do Bowing? As pessoas dos diferentes países orientais: As crianças e jovens – abraços fortes, sinceros, felizes. Dança, sorrisos e lágrimas. Conversas pessoais sobre sonhos, amores e também sobre tristezas, sobre a solidão e a discriminação. A força destes abraços é a força do Bowing em mim. Como se uniram crianças e jovens nesta vontade de dar e receber através da dança. E os adultos - os que não quiseram, não puderam ou não conseguiram encontrar espaço dentro de si para experimentar novas emoções e os que encontraram o espaço para um rasgo de alegria e auto-estima."