O meu nome é André Duarte, também conhecido por Júnior. Sou músico, arranjador, compositor e multi-instrumentista. A Lavrar o Mar tem desenvolvido muito do seu trabalho artístico com a comunidade local de Aljezur, dando origem a novos percursos e sinergias artísticas, nos quais tenho participado. Após meia década de colaborações e co-criações com a Madalena Victorino e com o Giacomo Scalisi, surgiu o convite para embarcar no projecto BOWING. Sendo eu um apaixonado por culturas e música tradicional de todo o mundo, e tendo o trabalho artístico com as comunidades como uma das minhas zonas de conforto, o projecto era sem dúvida um encaixe perfeito no meu trajecto pessoal e profissional. Durante o primeiro ano estive semanalmente com a equipa BOWING nas sessões com os trabalhadores de uma empresa agrícola, misturando a música com as várias linguagens artísticas presentes no projecto. O BOWING mostrou-se um desafio de reflexão artística sobre o papel da migração na sociedade e sobre a importância dos valores humanos e de integração. Um projeto sensível com um impacto a longo prazo. De Setembro a Novembro de 2021, fiz a direcção musical do primeiro espectáculo. Este processo de criação foi um grande desafio para mim, por toda a sua exigência estrutural e logística. Senti-me bastante esgotado, não só pela natureza do projecto mas também pelo momento que atravessava na minha vida pessoal. Apesar dos factores que condicionavam uma fluidez mais saudável, o BOWING foi um dos espetáculos mais bonitos e reveladores nos quais participei. O talento e sensibilidade artística e humana da Madalena, assim como de toda a equipa e elenco envolvido, contribuíram para uma viagem rica em experiências e de construção de novas relações e amizades. Das memórias mais fortes que guardo são os ensaios na Junta de Freguesia de São Teotónio, aos Sábados. As primeiras sessões eram um misto entre casting de talentos à deriva e aulas de aeróbica abertas ao público no Verão, na Quarteira. Não se sabia bem quem iria aparecer no ensaio e o efeito surpresa era uma reacção garantida. Cada vez que se mergulhava na missão de ensinar uma sequência de dança contemporânea à comunidade asiática os resultados eram hilariantes e reveladores, algo entre o belo e o caótico. Lembro-me também de um episódio no dia do ensaio geral, no largo da Igreja. A ira do senhor padre de São Teotónio que tentou agressivamente boicotar a banda BOWING assim que começámos a tocar. Nunca imaginei presenciar um padre possuído pelo demónio a ser confrontado, entre gritos e gestos, por um ateu comunista representado pelo querido e talentoso Pedro Salvador, guitarrista e compositor.
Fotografias de: João Mariano - 1000 Olhos